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Entrevistas

Farmácias demais e profissionais de menos aumentam riscos da automedicação, avalia presidente do CRF

Apesar da quantidade destes estabelecimentos, falta de farmacêuticos qualificados faz com que MS importe trabalho de outros Estados

13 novembro 2017 - 15h46Por Amanda Amaral

O pleno exercício da profissão de farmacêutico e o funcionamento legal dos estabelecimentos de venda de medicamentos são alguns dos principais aspectos que passam pela fiscalização do Conselho Regional de Farmácia em Mato Grosso do Sul (CRF-MS).

Em entrevista ao TopMídiaNews, a presidente do órgão, Kelle Slavec, farmacêutica e proprietária de farmácia há 23 anos, especialista em farmácia magistral, homeopatia e farmácia clínica, explica algumas das competências desse profissional, os principais problemas encontrados em fiscalizações e projetos do CRF no Estado.

Leia abaixo a entrevista completa:

Qual é o trabalho desempenhado pelo Conselho?

Fiscaliza o exercício da profissão, defende e protege a sociedade também com a regulamentação e a punição através do código de ética. Em todas as profissões existem bons e maus profissionais e a gente basicamente segue princípios da legalidade. O profissional faz a faculdade e se inscreve aqui para atuar, isso é outra coisa. 

Temos uma lei bem antiga, 5991, que fala desse aspecto que há de se ter um farmacêutico em todo o horário de funcionamento da farmácia. Outra lei mais recente, 3.021, que coloca o estabelecimento tanto privado quanto público como estabelecimento de saúde. Isso põe o profissional numa posição muito além de um mero entregador de caixinhas, mas que está ali para orientar, fazer o acompanhamento, intervenções, encaminhamento médico, se necessário, e também assistência farmacêutica plena. Se for urgência, vai encaminhar a um médico ou outro profissional.

Quais são os principais problemas que o conselho observa durante as fiscalizações no Estado?

São em geral a respeito da conduta do farmacêutico, que vai responder o processo ético. O que tinha mais eram as ausências, que, em um período de dois anos, se houver três delas injustificadas, ele responde por processo ético. As fiscalizações aumentaram a assistência farmacêutica por aqui.

Antes de 2014, tínhamos 75% de assistência farmacêutica plena em Mato Grosso do Sul, aumentamos para 85%, tanto é que temos falta desses profissionais aqui, temos que ‘importar’ de outros Estados. É obrigatório que haja um farmacêutico trabalhando enquanto a farmácia estiver aberta e, se não há, o estabelecimento recebe multas.

Além das farmácias, que outras áreas são possíveis para atuação do profissional?

Uma área que está crescendo bastante é a farmácia clínica, a gente tem duas resoluções que nos ajudaram, a 585 e a 586, que são relacionadas às atribuições clínicas, aprovadas em agosto de 2013, em plenária do Conselho Federal que ocorreu em Ponta Porã, no nosso Estado. Sobre o que podemos prescrever, aqueles que não tem tarja, um ganho para a profissão, podemos documentar e selecionar o que passar para o paciente. 

Na área da estética podemos atuar, por exemplo, na aplicação de botox, mas precisa ter especialização. Na clínica, você pode atuar em outras áreas, dentista, psicólogo, médico, antes era de maneira tímida, e agora com a resolução isso é muito mais amplo e importante, até mesmo para um atendimento mais humanizado, com mais cuidado e agilidade. Isso pode até mesmo contribuir para desafogar unidades públicas de saúde, quando os casos são menos complexos. 

Há diálogo com o poder público sobre a questão, muitas vezes deficitária, dos medicamentos que devem estar à disposição da população?
Com certeza, e as pessoas que identificam esses problemas podem entrar em contato com a ouvidoria do conselho e realizar denúncias, se ela não tem acesso a um medicamento ou nenhuma orientação farmacoterapêutica. É um direito da população essa assistência. Hoje vejo que temos processos licitatórios que dificultam o acesso aos medicamentos, entra e sai governo, tudo é muito demorado, quem sofre é a população. Mas vamos atrás sim de providências do poder público. 

Como o Conselho observa a crescente abertura de farmácias e os riscos do consumo impróprio de medicamentos?

A própria indústria fomenta esse comércio de um jeito um pouco irresponsável, quanto mais você vende, mais você ganha. Por isso que eu falo que é importante você confiar na orientação de um profissional competente, que promova um uso consciente, nenhum efeito colateral, nenhum perigo, nem desencadear outras doenças. O farmacêutico é um profissional fundamental de saúde, educa o paciente para uma melhor qualidade de vida. 

Acho que são duas coisas graves, o fomento dos riscos da automedicação, a medicação excessiva, muitas propagandas. O lobby maior é a parte financeira, as grandes redes faturam muito, e talvez sobrepõem o lado financeiro à saúde da pessoa. Para cada dez mil habitantes, a indicação é a existência de uma farmácia, o que não é o que a gente vê hoje, é muito mais. O fácil acesso é bom, mas tem um reflexo perigoso. 

Quais os projetos desempenhados pelo Conselho nos últimos anos?

São várias ações, para mostrar papel do profissional à sociedade, levamos o consultório farmacêutico para a sociedade, para a praça, atendemos pessoas que nem sabiam que estavam doentes, e foram encaminhadas a um médico. Fizemos capacitações, atingimos mais de dois mil de profissionais, em um estado que tem 3.200, um índice muito maior do que estados que tem 30 mil. Recentemente, tivemos nosso primeiro simpósio, não deixamos nenhuma área desassistida para qualificação. Isso minimiza as punições, torna o mercado mais preparado, responsável. 

Tem também o CRF mais perto de você, onde levamos essa informação ao interior, para que saibam que há um órgão para ouvir e defender a sociedade. Nossa ouvidoria tem o sistema online já no ar também, uma coisa muito importante. Implantamos o CRF Casa, com uma área restrita para requerimentos profissionais, para minimizar as burocracias, a emissão de certidão online.

Temos as ações sociais, os eventos todos têm fim social, angariamos doações sempre. No lixão, fomos falar sobre a dengue, levamos repelentes, orientamos em relação o zika vírus, o H1N1, fizemos cartilhas. O farmacêutico é geralmente o primeiro profissional, aliás, que pode orientar esse paciente que está com sintomas dessas doenças. 

Temos cerca de 12 comissões também, cada uma atuando em uma área, nos ajudando na parte técnica, temos por exemplo a clínica, oncologia, estética, comunitária, não são só profissionais ligados ao conselho, é um trabalho voluntário.